Universal Concreto
Ana Catarina Pereira
Graça Lobo
Cinema nas escolas algarvias
Um dia, Graça Lobo teve um sonho: levar o cinema às escolas. Fazer as crianças vibrar com a magia da sétima arte, fascinarem-se pelos filmes de Chaplin e Godard, ou mesmo interessarem-se por aquilo que lhes poderia parecer uma “grande seca”: o cinema português. Passado pouco tempo pôs mãos à obra e reuniu as ferramentas necessárias para concretizar o sonho. Hoje em dia, o projecto JCE (Juventude-Cinema-Escola) ocupa-lhe os quase 365 dias do ano. No Algarve, vários estabelecimentos de ensino, desde os mais cosmopolitas aos do interior serrano, aderiram a uma ideia que foi crescendo e tomando proporções inesperadas.
Graça Lobo licenciou-se em História em 1975. Começou por dar aulas no ensino secundário, sendo hoje técnica superiora da Direcção Regional de Educação do Algarve. Em meados dos anos 90 foi aluna de mestrado em Gestão Cultural, facultado em parceria pela Universidade do Algarve e pela Universidade Paris 8 - a vivência na capital francesa possibilitou-lhe assim um primeiro contacto com o projecto “Escolas ao Cinema”. Mais tarde, colaboraria também com a Cinemateca Portuguesa, culminando um percurso que a levou a apresentar uma proposta ao então Director Regional de Educação do Algarve: a de criar um programa didáctico de cinema para os alunos do ensino básico e secundário. António Pina aderiu imediatamente à ideia pelo que, no ano escolar de 1997/98, foi iniciada uma experiência piloto, tendo o programa arrancado oficialmente no ano seguinte.
Em termos económicos, o projecto foi apoiado pelo ICA (Instituto do Cinema e Audiovisual) desde o início, à excepção dos últimos dois anos. Durante o ano lectivo de 2000/2001 contaram ainda com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian. Em termos práticos, o percurso destes alunos é iniciado na sala de cinema, numa experiência distinta daquela a que estão habituados com a televisão ou o DVD. Em seguida, preenchem fichas de avaliação para consolidação dos conhecimentos, e alguns alunos chegam mesmo a realizar pequenos filmes, que são posteriormente avaliados por um júri e premiados nas festas de final do ano lectivo. Por vezes, são também organizadas coreografias, peças de teatro, momentos musicais e um quiz show - “A febre do cinema”. Nos últimos dois anos, o JCE tem ainda implementado duas novas iniciativas: a primeira chama-se “Vou levar os meus pais ao cinema”, invertendo os papéis tradicionais; enquanto a segunda dá pelo nome de “Ver para ler”, realizada em parceria com a rede de bibliotecas escolares e tendo como objectivo trabalhar a ligação entre cinema e literatura.
Quanto aos critérios de selecção dos filmes, e por se tratarem de alunos com idades particularmente marcantes em termos de construção de valores, a coordenadora do programa garante que existe uma preocupação com a mensagem social transmitida. É por essa razão que são analisadas longas-metragens como Billy Elliot (Stephen Daldry - 2000), sendo conjuntamente trabalhado o significado da tolerância e do preconceito: “Outro filme que os alunos adoram é ‘A vida é bela’ (Roberto Benigni – 1997), que muitas vezes os leva a ler ‘O Diário de Anne Frank’. Eles são particularmente sensíveis às questões da guerra e da paz. ‘O grande ditador’, por exemplo, também permite este tipo de reflexão.”
Por último, o sucesso da iniciativa parece ter ainda outro bónus: angariar espectadores para o cinema português. A grande maioria destes alunos tem aqui o seu primeiro contacto com curtas-metragens e animações de realizadores nacionais que, muitas vezes, se disponibilizam a estar presentes em sala e a responder às questões colocadas pelos jovens estudantes. Para Graça Lobo, o slogan do programa está assim a ser cumprido: “Ver, aprender e amar cinema”.
Faro- Quilómetros:
Distância Lisboa – Faro: 299 kms
Distância Porto – Faro: 571 kms
Coordenadas GPS: N 37º 01' 14.61" W 7º 55' 57.81"
Para além de concelho, Faro é capital de Distrito. Trata-se de uma cidade milenar de origem pré-romana, anteriormente conhecida como Ossónoba. Sendo um dos mais importantes centros urbanos da região Sul de Portugal, é anualmente invadida pelos milhares de turistas que, a cada Verão, não dispensam uma visita ao Algarve. Plantada à beira da Ria Formosa, a cidade apresenta um rico património histórico, uma vida cultural interessante e uma qualidade de vida invejável.
Juventude-Cinema-Escola
Em 2008 o programa comemorou 10 anos de actividade, com a milésima sessão de cinema em sala. Nele já participaram 25 mil alunos e 1250 professores de 60 escolas públicas da região. As candidaturas ao JCE são feitas no início de cada ano escolar pelos próprios professores, que podem ser de qualquer área. Os filmes devem ser trabalhados de uma forma interdisciplinar, como na Área de Projecto, por exemplo.
Sobre os critérios de escolha dos filmes, Graça Lobo sublinha que é sempre tida em conta a idade dos alunos, mas também uma vincada tentativa de escapar aos filmes exibidos nos circuitos comerciais: “Um dos meus sonhos é que eles venham a ter um papel mais activo na sociedade, contrariando a lógica da distribuição. Lembro-me de, um dia, estar a dar uma aula em Lagos, na qual tentava explicar aos alunos como funcionam as distribuidoras em Portugal. Abrimos o jornal para ver os filmes que estavam a passar nas salas de cinema mais próximas e eles chegaram rapidamente à conclusão de que só eram exibidos filmes norte-americanos, até que me começaram a perguntar: ‘Professora, o que é que nós podemos fazer para ver outros filmes? Estamos fartos de ver sempre as mesmas coisas!’ E é mesmo isto que eu quero, que eles se tornem mais atentos e interventivos.”
Para cada nível é seleccionado um filme que faz parte da história do cinema:
- 5º ano: “Há festa na aldeia” (Jacques Tati – 1949)
- 6º ano: “Serenata à chuva” (Gene Kelly e Stanley Donen – 1952)
- 7º ano: “Cinema Paraíso” (Giuseppe Tornatore – 1988)
- 8º ano: “Tempos modernos” (Charlie Chaplin – 1936)
- 9º ano: “O grande ditador” (Charlie Chaplin – 1940)
- 10º ano: “Couraçado Potemkin” (Sergei Eisenstein – 1925)
- 11º ano: Psycho (Alfred Hitchcock – 1960)
- 12º ano: “O acossado” (Jean-Luc Godard - 1960)
Ana Catarina Pereira