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Cristina Pereira, 33 anos

Técnica de Engenharia Industrial

Sorriso fácil, simpatia e organização. Estas são as principais características que os familiares de Cristina Pereira lhe apontam. Nascida em Oeiras, cedo foi morar para o Peso, uma pequena aldeia do concelho da Covilhã onde os costumes e as tradições são seguidos pela maior parte da população. Num processo de integração evolutivo e natural, a família foi assimilando alguns hábitos, pelo que a religião católica passou a fazer parte da sua vida: “Aos domingos, a ida à missa era feita pela mão da minha avó, que sempre me ensinou a rezar. Ela dizia que, para se vencer qualquer obstáculo, é necessário ter fé e este é um princípio que ainda hoje me orienta. A religião ensinou-me a distinguir o bem do mal e a ajudar quem precisa de mim, sem esperar nada em troca.” Respeitando os ideais formados na infância, Cristina Pereira licenciou-se e casou ainda muito jovem. À bênção das fitas seguiu-se uma nova cerimónia religiosa, onde prometeu amar e ser fiel ao seu actual esposo. Em ambos os momentos, considera a ida à Igreja, testemunhada por familiares e amigos, de extrema importância.

Dez anos passados, Cristina Pereira cumpre a difícil tarefa de conciliar uma vida profissional intensa com uma vida pessoal igualmente exigente. Perfeccionista em tudo aquilo que faz, procura dar o seu melhor nas curtas 24 horas do dia. Como técnica de Engenharia Industrial, trabalha no ramo automóvel, numa empresa da Guarda. Num universo onde o sexo masculino é preponderante, Cristina Pereira, conservadora em aspectos que desenvolveremos adiante, é frequentemente vítima do mesmo tipo de situações: “Uma vez, numa entrevista de emprego que me tinha corrido particularmente bem, o responsável pelo recrutamento disse-me, com todas as letras, que era uma pena eu ser mulher! Passadas duas semanas, a mesma pessoa que me deu essa resposta telefonou-me a perguntar se estava disponível para colaborar durante dois meses na empresa, até que o funcionário que admitiram se sentisse mais confiante.”

 

Quando lhe perguntamos como se define em relação ao tema desta edição, responde que não costuma ter ideias conservadoras radicais: “Na maior parte dos casos até me considero bastante liberal. Porém, tenho de confessar que não consigo aceitar a ideia da adopção de crianças por casais homossexuais.” A família tradicional que construiu (e da qual provém) não lhe permite configurar outros parâmetros: “Sei que uma criança, numa família homossexual, pode ser tão bem acarinhada e educada como numa família dita tradicional. Mas penso que, na actual sociedade (que é bastante conservadora), esta criança será sempre identificada ou rotulada como tendo duas mães ou dois pais.” Apesar disso, reconhece a dificuldade em manter esta opinião, sobretudo quando olha para crianças vítimas de violência ou abandono pelos verdadeiros pais, que poderiam ter uma vida melhor em caso de adopção.

 

Rodrigo Moita de Deus

31 anos, consultor de marketing

Rodrigo Manuel Botelho Moniz Moita de Deus. Casado e pai de três filhos. Católico, conservador e monárquico (não necessariamente por esta ordem). Uma das caras mais mediáticas do blog 31 da Armada – os mesmos que, em Agosto, hastearam bandeira frente à Câmara Municipal de Lisboa.

 

Na opinião de Rodrigo Moita de Deus, nem todos os monárquicos são conservadores (e vice-versa): “eu, por acaso, reúno as duas condições (risos).” Frequentou a licenciatura em Direito (que não chegou a terminar), tem formação superior em Marketing e Publicidade e estuda Antropologia. Do seu curriculum fazem parte algumas escolas de ensino público e outras tantas de ensino privado pelo que, relembra, não deve ser classificado como “um dos daqueles meninos que estudaram nos Salesianos ou nos colégios católicos.”

Assim sendo, o que faz de Rodrigo Moita de Deus um conservador? Numa auto-análise do próprio, a resposta prende-se com a postura defensiva, céptica e cínica que adopta perante a vida. Como exemplo, afirma que, quando assiste a manifestações por causas sociais tão diversas como a Palestina ou o casamento entre homossexuais, tem tendência imediata a desconfiar dos reais objectivos daquelas pessoas: “Eu não acredito na bondade intrínseca dos homens!”

 

Apesar de católico, considera que a religião não ocupa um lugar mais importante na sua vida do que na de qualquer outro português, criado numa cultura judaico-cristã. Em termos ideológicos, Rodrigo Moita de Deus defende que a melhor forma de governação de um país continua a ser a monarquia, sobretudo por questões de ordem estética: “O conceito de monarquia é muito mais engraçado do que o de república! Basta ver os filmes: se ser presidente fosse uma coisa excitante, punham-no nu, a cavalo, a combater em grandes batalhas.” Para o monárquico, este é um ensinamento tão verdadeiro que chega a ser transmitido nas escolas públicas dos regimes republicanos: “Nós continuamos a aprender que a monarquia é que foi gira - o tempo das grandes batalhas, dos descobrimentos e das conquistas.”

 

Para além da questão estética, Rodrigo Moita de Deus assegura-nos que a sua opção comporta um fundamento racional: “Não faz sentido ter um chefe de Estado a recibos verdes! A monarquia é o regime que melhor defende a continuidade de um país.” Na sua opinião, o rei personifica os valores de uma nação (o que lhe confere uma isenção política e partidária) e assegura uma estabilidade a longo prazo, enquanto o Presidente da República se encontra limitado por um mandato: “O país não pode continuar a ter rupturas de cinco em cinco anos. Os próprios franceses já reconheceram isso e aumentaram os mandatos do Presidente da República. Na Holanda, Bélgica e Inglaterra, a coroa é uma referência.”

 

Com todos estes ideais em mente, Rodrigo Moita de Deus foi um dos organizadores da iniciativa de trocar as bandeiras frente à Câmara Municipal de Lisboa, o que parece entrar em contradição com a forma como se auto-define: “Eu não sou um revoltado. Eu vivo nesta sociedade e gosto dela. Enquanto conservador, não me revolto, mas colaboro e construo.” Na sua opinião, apesar de estar sujeita a punição legal, esta não foi uma medida revolucionária: “Um verdadeiro conservador acha que não tem o direito de impor nada aos outros. Se eu quisesse realizar uma acção revolucionária teria ido com armas na mão.” Para Rodrigo Moita de Deus, o objectivo essencial era “agitar as mentes das pessoas, naturalmente preguiçosas e acomodadas”, o que afirma ter conseguido.

                               

Nuno Miguel Guedes

Jornalista, 45 Anos

Ser conservador é, para Nuno Miguel Guedes, uma forma de estar na vida. Aos 45 anos, faz da palavra escrita a sua profissão: é jornalista free-lancer, trabalha como guionista e escreve letras de músicas, algumas delas interpretadas pela fadista Ana Moura. Como Rodrigo Moita de Deus, é também um dos mais activos bloggers do 31 da Armada e um dos promotores da polémica troca de bandeiras. As suas opções e ideologias têm, no entanto, outros fundamentos.

 

Membro do Conselho Superior da Causa Real, considera-se monárquico e conservador, embora sublinhe que os dois conceitos são distintos e, a maioria das vezes, separáveis. Num universo de cerca de 4000 monárquicos portugueses, garante que existem diferentes formas de pensamento, apesar da adesão a uma causa comum. Para o exemplificar, afirma conhecer alguns monárquicos de esquerda, outros com uma visão mais progressista e alguns mesmo sem qualquer tipo de crença religiosa.

 

Não é o caso de Nuno Miguel Guedes, que se converteu ao catolicismo aos 32 anos. Educado numa família republicana e de esquerda, reconhece que os valores transmitidos pela família não foram os mesmos que hoje defende: “Essa história de que os monárquicos são todos aristocratas decadentes, de fatinho e bigode, não é verdade. Como eu, há imensa gente normal, de classe média, que simpatiza com a causa.” A ausência de títulos nobiliárquicos, bem como a educação progressista, não fariam prever tão grandes mudanças ideológicas, religiosas e políticas. A explicação é dada na primeira pessoa: “Eu cheguei à monarquia por forma intelectual, com 17 ou 18 anos. Fazia-me confusão admirar uma série de pessoas monárquicas, como o arquitecto Gonçalo Ribeiro Telles, Miguel Esteves Cardoso, Fernando Pessoa, ou o poeta João Miguel Fernandes Jorge.” A curiosidade falou mais alto e Nuno Miguel começou a interessar-se pela temática. 

Por sua vez, o seu conservadorismo advém da importância que o filósofo inglês Michael Oakeshott teve na sua vida. No ensaio “On being conservative”, o autor defende a predisposição do ser humano para ser conservador, por estar apegado à família e ter receio da surpresa. A identificação com a teoria foi imediata: “Na minha vida, prezo muito o cepticismo em relação ao novo. Penso sempre ‘Vamos mudar porquê? Calma!’ Em tudo, é importante olhar para aquilo que já foi testado e que sobrevive ao tempo, tanto em pratos de culinária como em sistemas de governação.”

 

A postura descontraída durante a entrevista, bem como o aspecto informal com que se apresenta, conjugam-se com a filosofia de vida que absorveu do filósofo inglês: “Oakeshott dizia que podíamos ser conservadores na forma de governo e radicais no aspecto e em todas as actividades. É assim que eu me vejo, sinto-me uma pessoa livre, com algum cepticismo em relação à mudança.” A julgar pelas declarações seguintes, Carpe Diem poderia mesmo ser o seu lema: “Ser conservador, para mim, tem tudo a ver com o presente e não com o passado ou com o futuro. Uma pessoa que vive em função do passado não é conservadora, mas sim reaccionária, que são coisas diferentes. Um conservador vê o dia de hoje, sem pensar nas utopias do amanhã, nas quais vamos todos ser felizes.” Para Nuno Miguel Guedes, a utopia não é concretizável na terra, por ser incompatível com a própria natureza humana.

 

Apesar disso, acredita que existem formas de melhorar e progredir, sempre através de evoluções e nunca de revoluções: “A única coisa que eu gostaria de voltar a ver na sociedade portuguesa era um rei, um chefe de Estado não eleito, que subisse ao trono por sucessão dinástica. De resto, não queria mudar mais nada.” Em termos de governação, salienta que acredita na democracia e no Parlamento como órgão de soberania central. Com um sorriso nos lábios, acrescenta: “Nós costumamos dizer que o caso das escutas em Belém foi o melhor que poderia ter acontecido à monarquia em Portugal. É um exemplo de conflito institucional que mina a democracia e que tem que ser evitado.”

 

Susana Ribeiro, 28 anos

Consultora de Marketing e Comunicação

Comunicadora e expressiva por natureza, Susana Ribeiro é o protótipo de uma “self-made woman”. Aos 28 anos, lidera uma empresa que ela própria criou – AmazingIdeas management consulting - e é responsável pela comunicação institucional de diversas marcas nacionais e internacionais. Natural do Porto, onde trabalha, é licenciada em Relações Internacionais. A opção académica por um curso com poucas saídas profissionais esteve, desde cedo, relacionada com os seus valores e personalidade. Aos 18 anos, quando entrou para a faculdade, Susana Ribeiro queria “salvar o mundo”, trabalhar numa ONG e espalhar os seus valores cristãos.

Actualmente, desenvolve uma carreira profissional singular. Positivista por natureza, encara o conhecimento e a arte como meios privilegiados de evolução no mundo dos negócios: “A formação em Relações Internacionais deu-me uma visão humanista do mundo, onde os valores morais como o respeito, a justiça ou a liberdade fazem todo o sentido na governação dos países e das empresas.” Utopia ou ingenuidade? Esta é, para Susana Ribeiro, a única forma possível de trabalhar, mas também uma postura que já lhe garantiu alguns dissabores no competitivo universo em que se move. Serão os seus valores incompatíveis com os do mundo dos negócios? A consultora de marketing e comunicação conhece essa hipótese, mas continua a não aceitar a velha máxima “se não os podes vencer, junta-te a eles”.

 

Irredutível nos seus princípios, Susana Ribeiro é um dos daqueles seres humanos que os mais pessimistas consideram já não existir. Ainda na “casa dos vinte”, já não se revê nas gerações mais novas: “Com a democratização de tudo, os valores humanos e sociais foram delegados para um segundo plano; parece que estão a desaparecer.” Na sua opinião, esta democratização gerou efeitos colaterais graves, como a legitimidade de todos os comportamentos. Preocupada com as imagens que diariamente recebe de violência nas escolas ou de crianças mimadas que reclamam os mais dispendiosos meios tecnológicos, defende um regresso a determinados valores que foram caindo em desuso: “Acredito que a religião é (e continuará a ser) um dos pilares fundamentais da nossa civilização, independentemente da crise ideológica que actualmente se vive.” Na esfera privada, por sua vez, Susana Ribeiro considera que “a família é a base de toda a sociedade e o ponto de partida para a construção de um futuro melhor para as próximas gerações.” Por último, quando lhe propomos um exercício de auto-análise, afirma não se sentir conservadora típica, mas antes “consciente dos valores que importa preservar”.

Ana Catarina Pereira

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